CONVERSA FIADA



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- Mamãe, você já reparou que todo bandido é preto?
Com esta frase minha raspa do tacho concluiu sua longa dissertação de aproximadamente dois minutos sobre medo e violência. Para ele, apenas os pardos, ou negros fazem parte das ações criminosas deste país. E é muito interessante a percepção do meu filho de apenas seis anos, porque com todo o avanço que tivemos, todo movimento de inclusão, é isso mesmo que temos: uma exposição exagerada de gente de pele morena ou negra colocada como troféu de polícia diante das câmeras de TV, todos os dias. Vide as dúvidas que pairam sobre o Amarildo, o que é absolutamente irrelevante já que nada justifica o que ocorreu com o ajudante de pedreiro. E o meu filho continuou:
- Você não reparou que até a roupa dos “vândalos” é preta, mamãe?!?!
Claro que existe o lance da maioria étnica do nosso país, o Brasil é muito misturado, negros e pardos exitem em maior quantidade mesmo, mas, independente do concreto que inclui até o tom do modelito dos Black Blocs, o fato é que a maneira como as coisas estão tomando forma na cabecinha do meu filho andam me preocupando. Vou precisar de muita habilidade para colocar as coisas no lugar, remover as distorções subliminares. Selvagem!
Bom, mas diante do tema, confesso que minha mente voou longe. Não pude deixar de pensar nos inúmeros criminosos de colarinho branco que destroem a vida de tantos brasileiros e que ficam muito pouco expostos se formos comparar. Crime este, o de corrupção, que é muito mais vil do que qualquer outro na minha opinião, porque rouba aquilo de mais valioso que uma pessoa pode ter: A Dignidade. Cada verba de educação, saúde ou moradia roubadas, leva embora a chance de um futuro melhor. Alijam milhares de crianças e trabalhadores, cerceiam o direito de existir, de ser efetivamente alguém reconhecido, estabelecido no lugar e no espaço. De competir em pé de igualdade. E para parodiar alguém ... “Só que não”.  Não temos nada disso por aqui em pleno século XXI. E como me incomoda o rumo que as coisas estão tomando. Me sinto em processo de involução. Não quero mais aceitar a hipótese de “Utópica” a ideia de escola gratuita de qualidade para todos. De um judiciário honesto, rápido, que funcione para todos. Políticas econômicas e sociais com investimentos concretos, com metas e objetivos definidos a cumprir. Uma sociedade unidade, interessada, positiva e participativa. Uma sociedade decente, que não vai tentar “dar um jeitinho” sempre que o calo de marca apertar. Precisamos mudar. Todos nós. Negros, brancos, pardos, amarelos, gays, héteros, pobres, ricos, mamelucos e cafusos. A luta precisa ser pela igualdade em todas as esferas e não sobre Biografias autorizadas ou proibidas. Quando penso que já vi de tudo, que não vamos descer mais baixo, sermos mais manipulados, eis que surge um “Apartheid Artístico”. Francamente! Uma grande perda de tempo e de energia, o caos intencional que interessa a “alguém". Claro! Não parece óbvio? Até o Papa Francisco advertiu: "Cuidado com a manipulação". A luta precisa ser pela igualdade. Pela aplicabilidade das leis. Pela justiça. Pela Constituição Brasileira. Todo o resto é conversa fiada que interessa a “alguém”. E não me venham com a história de o quanto as classes mais baixas ascenderam, porque o que acontece hoje com as classes mais baixas é que são reféns. Refens das bolsas. Reféns do governo. Quase o mesmo que viver na senzala e dever na venda do sinhôzinho.
Desculpem o desabafo, disse que voei longe, mas precisava compartilhar onde fui com os meus pensamentos. E de volta ao cerne da crônica, senti na minha pele branca, dentro da minha casa no asfalto da zona sul, que muito se fala sobre racismo, mas pouco se fala sobre racismo. E minha conclusão ou sensibilidade está longe de concordar com as tais cotas, já que defendo investimento em educação para todos e não assistencialismo para alguns. Democracia para mim é isso. Agora todo o resto .... é conversa fiada que interessa a "alguém".

"UM DOMINGO DE SOL"


Paula Santana


Domingo de sol, Rio de Janeiro, crianças e a nossa decisão familiar foi ficar em casa. Pode parecer estranho, até um desperdício, mas a nossa vontade era curtir uma “house”, como dizem os adolescentes, em vez de de enfrentar areias quentes, disputar metro quadrado de praia, aquela coisa de fazer parte da conversa dos outros sem estar a fim. Queríamos ficar à toa, com privacidade, sem nenhum tipo de compromisso ou função para desempenhar socialmente.
Deitei no sofá da sala, peguei um livro, e, de repente, me dei conta do silêncio que pairou no ambiente. Teria sido ótimo, motivo até de comemoração se, se ... eu não tivesse filhos. Quem é mãe, sabe bem como a calmaria pode significar o caos. Um sinal de problema. E dos grandes. Que criança fica quietinha, sem fazer barulho, a não ser por motivo de doença ou quando está aprontando? Decidi levantar e averiguar, enquanto pensamentos com vida própria invadiam a minha cabeça: “Alegria de mãe dura pouco.” Surpresa! Me enganei. Nos enganamos. Eu e os meus pensamentos. Aconteceu o inusitado: Os quatro brincavam sentadinhos no chão do quarto, em completa harmonia, um entrosamento até interessante levando em consideração a diferença de idade entre eles. “Tudo numa boa”, como diria Rasputia Norbit. Dava para sentir o cheiro de fraternidade no ar, quase palpável a cumplicidade presente. A cena era do tipo filme sessão da tarde, bem famílinha “Doriana”?!?! Dispensável dizer que me emocionei. E isto, segundo meus filhos, não significa grande coisa, já que choro até quando o Bob Esponja se dá mal. 
Nunca quis ser mãe de um filho só. Tudo bem que eu não premeditei mais do que dois, as coisas foram acontecendo, mas apenas um, eu sempre tive a certeza de que não gostaria de ter. Quem tem irmãos sabe o quanto é bom a simples sensação de compreensão. Mesmo que você fique meses sem ver, sem falar, que as afinidades não sejam lá estas coisas, somente um irmão é capaz de entender tão bem outro irmão. E quando o ódio é a temática da relação, quando chegamos ao nível de Caim e Abel, arrisco apostar que seja o resultado do excesso de intromissão dos pais. Irmãos têm toda uma relação própria, que deve ser independente, não pode e nem deve sofrer interferências. Agora, quando essas interferências ocorrem, não tem jeito: a competição, o ciúme e a inveja tomam proporções doentias. E isso me remete a um filme antigo à beça, chamado “O que teria acontecido a Baby Jane”. Maravilhoso! Todo mundo tinha que assistir Beth Davis neste papel. A obra mostra de maneira sensacional que as coisas nem sempre parecem o que são. 
Bom, agora vou aproveitar este momento único em que pude até escrever esta crônica inteira sem se quer ouvir um "Manhêêê", continuar o meu livro, sossegada no sofazinho, neste domingo lindo de sol e descansar .... descansar ... descansar ...  até .....  que o “Meu Adorável Mundo Selvagem” diga: Só que não, Mammita!

Até a Próxima!

Paula Santana

EU E MEUS EUs!


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A professora convocou uma reunião para pedir a ajuda dos pais. Quer auxílio para dar conta das crianças em sala de aula. Segundo ela, andam muito agitadas, indisciplinadas; relatou que os professores de educação física, inglês e informática, por exemplo, não conseguem mais concluir suas funções com o êxito desejado. Para contê-los, como reprimenda mesmo, já tirou o pátio, o lanche, a hora das brincadeiras, da rodinha e ... nada. Nada de mudarem de atitude. Nada mais para castigá-los  também. Sendo assim, diante de tamanha dificuldade em se fazer impor, decidiu chamar os responsáveis para conversar.
Confesso que num primeiro momento não pude deixar de me solidarizar. Um dos meus “EUs” identificou logo alguma semelhança entre nós:
- Que Selvagem! Pobrezinha! Professores deveriam ganhar muito dinheiro e com direito a todo aquele lance de insalubridade, etc e tal. 
E antes que eu pudesse maturar meu primeiro impulso, logo surgiu meu lado contestador para contrapor:
- Mas como assim, os professores não estão dando conta das crianças em sala de aula? Sim, porque por mais “mal-educadas” que sejam, o colégio não pode demonstrar tamanha fragilidade frente a este tipo de situação envolvendo meninos tão pequenos! Que mensagem vai ficar disso? Que podem tudo? São invencíveis? De que não há limites e nem regras em “Moscou”?!?!
E de novo, antes mesmo que eu pudesse concordar com qualquer uma das teses anteriores, minha porção esotérica aflorou:
- Esperem. Vamos com calma. Já pensou que podem estar sendo estimuladas de maneira inadequada? Subestimuladas, melhor dizendo?!? Nunca ouviram falar em crianças Índigo e Cristal?
Nossa! Às vezes eu me assusto com a quantidade de pessoas que moram dentro de mim. É muita mulher num corpo só. Existe a compreensiva,  aquela que argumenta até a cor do sol, a zen, a Mulher Maravilha, a vítima do mundo, tem até uma meio psicóloga que pontuou sem pedir licença:
- Claro que as crianças estão agitadas. Olha tudo que está acontecendo a nossa volta?!? Como não absorverem? Amarildos, Rebecas, manifestações, violência, Black Blocks. Crianças são como esponjinhas! Sem falar na falência das instituições de uma maneira geral, na falta dos limites sociais. Falta Educação com “E” maiúsculo mesmo, aquela que transcende as matérias da grade curricular. Obviamente, vai ficar bem complicado estabelecer critérios com relação a respeito; a história do seu direito começa onde termina o do outro. E é interessante que a professora da escola particular tenha solicitado a ajuda das famílias, no momento em que os professores da rede pública também imploram pelo apoio das famílias pelas ruas do país.
Conclusão? Concordo com cada uma de mim. Acho que todas temos um pouco de razão e com um agravante para tornar ainda mais complexa a coisa toda: venho testemunhando uma espécie de “incomunicacão” generalizada. Como se existisse um “microcaos” agindo na comunicação interpessoal. Esquisito ...
Bom, mas independente de elucubrações desta ou daquela natureza, é incontestável a necessidade de agir. A minha necessidade de agir como mãe diante da demanda da professora. De todos os pecados que existem no quesito maternidade, acho que a omissão é o mais prejudicial deles todos. E se coloquei filhos no mundo .... eu que os embale. Não é assim? Com a palavra final, o meu “Eu” tolerância zero:
- Querido, sinto muito, mas enquanto você não mudar seu comportamento, nada de games, figurinhas e outros desejinhos que lhe são peculiares, ok?